Neste dia do poeta, vai esta singela homenagem
aos poetas que reverencio em primeiro plano.
Quando três poetas famosos
ascenderam ao mundo espiritual,
os mestres dos respectivos artistas
perguntaram o que eles gostariam
de ter feito na terra caso não houvessem
optado pelo mundo das letras.
Jorge Luis Borges respondeu:
gostaria de ter sido ourives
para restaurar com pedras preciosas
a Biblioteca da Alexandria.
Teria revestido com ouro genuíno
o acervo completo da Biblioteca
Nacional de Buenos Aires.
Teria recolhido os vocábulos maltratados
pelas pessoas avessas
ao bom uso da língua
e os lapidados para devolve-los
ao altar do idioma,
porque a palavra é sagrada.
Fernando Pessoa falou:
quisera ter sido um jardineiro
para cantar todas as flores
existentes no mundo,
inclusive aquelas que passam
desapercebidas pelos indivíduos apressados,
e o meu contentamento não teria sido menor
que a alegria de ter poetizado a vida.
Para cuidar das flores
não é necessário criar artifícios
nem dar outro sentido às palavras
além daquele intrínseco às mesmas.
Não é nem mesmo necessário
dar nome às flores.
Também não é necessário filosofia no trato com elas.
Para ler o livro que as flores escrevem na natureza
é preciso apenas ter olhos, olfato, sentimentos
e desapego de toda a vaidade.
Mario Quintana disse:
eu gostaria de ter sido o gestor
de uma biblioteca de sonhos ;
uma casa aberta aos oníricos,
pessoas não compreendidas na terra,
que sonham, solitárias, com medo
de perturbar a vida ordenada
dos indivíduos materialistas
que catalogam como loucura
qualquer atitude não padronizada,
processada pelas pessoas distraídas.
Durante minha vida inteira
fui testemunha ocular
da incompreensão sofrida pelo sonhador;
aaté questionaram minha sexualidade
- diziam; ah, o Mário não gosta de mulher -
porque eu nunca casei.
Justamente eu, que amava a todas as mulheres,
mas não seria adequado nem recomendável,
que eu entregasse minha vida a uma delas,
pois eu não podia perder a graça das musas,
seres especiais, únicos e caprichosos...
Para completar a questão,
talvez eu não pudesse ter sido outra coisa,
senão aquilo que fui, pois, quem sabe, no fundo,
sonhador e poeta sejam grãos da mesma seara.